domingo, 19 de maio de 2013

A Proteção Constitucional e Internacional do Direito à Liberdade de Religião


A Proteção Constitucional e Internacional do Direito à Liberdade de Religião
De Patrícia Elias Cozzolino de Oliveira

Sinopse: A história constitucional do direito à liberdade de religião no Brasil demonstra que mesmo tendo a laicidade do Estado ingressado no ordenamento constitucional por meio da Constituição de 1891 - a Constituição do Império de 1824 adotava o catolicismo como religião oficial - o direito à liberdade de religião teve sempre seu âmbito de abrangência real vinculado ao modelo de Estado adotado. Tal afirmação se justifica porque na época da Ditadura - Constituição de 1961 - o texto constitucional protegia tal direito de maneira expressa e pouco diversa da atualidade, contudo, pouco se protegeu efetivamente. Este estudo busca analisar o direito à liberdade de religião no contexto específico da casuística da Corte Européia de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal, nesta última Corte após a Constituição de 1988.
No primeiro capítulo do trabalho buscamos traçar aspectos importantes da evolução histórica constitucional do direito à liberdade de religião no Brasil, lembrando que a historicidade é uma das características dos direitos fundamentais, no caso a liberdade de religião. Optamos por traçar contornos filosóficos acerca do conceito de liberdade, por entendermos que o direito muito tem a ganhar com a filosofia e a liberdade é antes de tudo um fenômeno existencial, adentrando posteriormente na seara do Direito. Buscamos também um conceito sociológico para a religião, por meio de ÉMILE DURKHEIM, pois necessitávamos definir o fenômeno religioso sob um prisma universal e não sob o prisma de uma confissão religiosa determinada. O direito à liberdade de religião é o berço histórico dos direitos fundamentais, eis que a tolerância religiosa, um dos aspectos da liberdade de religião, principiou o percurso dos direitos fundamentais.
Logo, no terceiro capítulo definimos direito fundamental para demonstrar que a liberdade de religião é um direito fundamental calcado na primeira dimensão de direitos, pertinente a individualidade. Nesse prisma pode-se afirmar também ser um direito de personalidade, pois a crença faz parte da identificação do indivíduo perante o grupo e si próprio.
O direito à liberdade de religião cujos contornos se encontram na Constituição Brasileira de 1988, diz respeito a esfera íntima do indivíduo (liberdade de consciência e de crença) e a esfera externa (exercícios dos cultos religiosos), pressupõe uma atitude passiva do Estado - respeito a escolha do cidadão, impossibilidade de vínculo ou privilégio a confissão religiosa distinta, a exemplo no disposto no Art. 19, I, da Constituição de 1988; e também uma atitude ativa, na promoção da diversidade religiosa, a exemplo do Art. 150, VI, "b", da Constituição de 1988. Durante a análise da casuística da Corte Européia de Direitos Humanos pudemos identificar o fenômeno da colisão de direitos fundamentais, pois em determinado contexto histórico a Corte entendeu ser correta a intervenção do Estado na liberdade de religião do cidadão, uma vez que o ato se legitimava para a garantia do princípio da igualdade, a não discriminação, a paz social e outros valores fundamentais do Estado Democrático de Direito (caso Leyla Sahin versus Turquia); caracterizando a clara aplicação do princípio da cedência recíproca dos direitos fundamentais, tendo como critério de solução o princípio da proporcionalidade.
Já no caso Müslüm Gündüz versus Turquia a decisão da Corte Européia de Direitos Humanos foi em favor do cidadão, que havia se expressado publicamente afirmando que o regime secular da Turquia era contra o Islã e que o caminho natural seria que este último assumisse o Estado. A Corte entendeu que o direito à liberdade de religião e o direito à liberdade de expressão não protegem somente as declarações agradáveis ao Estado em uma democracia, condenado a Turquia a pagar valor em dinheiro para o Sr. Gündüz, que havia sido condenado pelas leis penais turcas; mais uma vez o princípio da proporcionalidade foi aplicado, contudo, entendeu-se que a intervenção estava prescrita em lei, mas no caso concreto não era legítima. Houve momento, a exemplo do caso Cha'are Shalom Vê Tsedek versus França, no qual a associação litúrgica Cha'are Shalom Vê Tsedek ingressou na Corte Européia de Direitos Humanos contra a França em face da negativa daquele país em autorizá-la a efetuar o abate religioso judaico, que discordamos do entendimento da Corte, filiando-nos aos votos divergentes que melhor resguardaram o pluralismo, característica fundamental da democracia. De uma maneira geral, durante a análise da casuística da Corte Européia pudemos constatar como a prevalência de um ou outro direito fundamental estará sempre adstrita ao contexto histórico, destacando claramente a importância da historicidade e da limitabilidade, enquanto características inerentes aos direitos fundamentais. Também fizemos sempre questão de tecer as nossas considerações acerca da fundamentação das decisões, procurando identificar quais os direitos fundamentais colidentes e qual a opção motivada da Corte. Após a pesquisa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre liberdade de religião, com o auxílio da biblioteca daquele tribunal, verificamos que é exígua, senão inexpressiva, a jurisprudência da Suprema Corte sobre esse tema. A pesquisa foi desenvolvida com característica exploratória e delineamento bibliográfico, não se tratando somente de trabalho compilatório, mas de verdadeira constatação científica de uma hipótese, qual seja, o Supremo Tribunal Federal, no que se refere a liberdade de religião, se inspira na Corte Européia de Direitos Humanos, pois os critérios de decisão são muito similares e no caso Siegfried Ellwanger (HC n° 82.424-2-RS), o Ministro Gilmar Ferreira Mendes cita julgados da Corte Européia de Direitos Humanos como fundamentação de seu voto. Na verificação da hipótese citada, utilizou-se durante a investigação o método de abordagem dedutivo, com a observância dos métodos de interpretação: histórico, sistêmico, lógico, teleológico e axiológico; sendo que ao final foi emitido o juízo de valor da autora sobre o assunto pesquisado.

Sobre a autora: Doutoranda em Direito Processual Civil pela PUCSP, Mestre em Direito Constitucional pela Instituição Toledo de Ensino de Bauru (2006), Especialista em Direito Processual Penal pela Universidade Católica Dom Bosco (2003) e graduada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (1995). Defensora Pública do Estado de Mato Grosso do Sul, lotada na 46a. DPE em Campo Grande/MS. Professora Universitária, já tendo ministrado aulas na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS, na AEMS em Três Lagoas/MS, na Instituição Toledo de Ensino de Bauru/SP e no Curso Preparatório para Concursos Pró-Ordem de Marília/SP. Professora convidada em programas de pós-graduação ministrando aulas de direito constitucional e direito processual constitucional. Membro do IBDC - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional.

Ano: 2010.

Editora: Verbatim.