sexta-feira, 12 de março de 2021

Entre a fé e o direito: as controvérsias sobre a última indicação à Suprema Corte dos EUA

Entre a fé e o direito: as controvérsias sobre a última  indicação à Suprema Corte dos EUA

Orientadora: Gabriellen da Silva Xavier do Carmo, mestranda voluntária do Cedire

Autora: Joyce de Fátima Garcia Silva

Após a morte de Ruth Bader Ginsburg, a juíza Amy Coney Barrett  foi indicada para ocupar sua cadeira na Suprema Corte dos Estados Unidos, a mais alta instância judicial do país, que assim como o Supremo Tribunal Federal no Brasil tem a função de zelar pela constitucionalidade das leis. A Suprema Corte americana é composta por nove juízes designados pelo Presidente e posteriormente aprovados pelo Senado, para um mandato vitalício. A juíza obteve o apoio do então Presidente Donald Trump e dos grupos conservadores, principalmente por apresentar em seus discursos opiniões religiosas fortes. Amy é católica praticante, mãe de sete filhos e se opõe pessoalmente ao aborto, uma das principais questões que dominam a divisão cultural nos Estados Unidos e geram conflitos entre grupos políticos.

Um dos pontos defendidos pelos opositores à indicação era que a experiência da juíza não seria adequada para compor o Tribunal. Para embasar isso, citaram como argumento os vários artigos que ela escreveu sobre questões judiciais enquanto lecionava na Universidade de Notre Dame. Ainda nesse sentido, enfatizavam uma palestra ministrada pela juíza onde teria descrito a carreira jurídica como apenas um meio para um fim e esse fim, em sua opinião, seria a construção do Reino de Deus. Alegava-se também que as recentes decisões da magistrada deixavam transparecer suas inclinações ideológicas, a exemplo de suas atividades no Tribunal Federal de Apelações em Chicago, nas quais ela apoiou o direito das armas, se opôs aos migrantes e mulheres que buscavam o aborto e se posicionou contra o Affordable Care Act, ou "Obamacare", a reforma da saúde promovida pelo ex-presidente que os republicanos buscam desmontar por anos, bem como teve a intenção de derrubar a decisão do caso Roe v. Wade, um marco histórico que tratou da legalização do aborto nos EUA.

Ocorre que, partindo do pressuposto de que a função exercida por um juiz deve ser de todas as formas pautadas pela imparcialidade, o fato de a magistrada expressar suas opiniões de forma aberta e incisiva poderia transparecer parcialidade em relação a determinados assuntos que podem se tornar objeto de ações judiciais na Suprema Corte num futuro próximo.

Entretanto, em meio às diversas opiniões que dividem o país, o apoio que Amy Coney Barrett teve por parte da bancada conservadora foi bastante significativo, bem como o apoio do então Presidente. A juíza ganhou ainda mais força em seu processo de confirmação no Senado, em que se envolveu em um conflito com a veterana democrata Dianne Feinstein, que se pronunciara sobre alguns de seus dogmas, declarações essas que foram usadas posteriormente por partidários de Barrett para acusar a própria Feinstein de intolerância, o que fomentou sua posição entre a direita religiosa.

Ademais, é necessário salientar que o fato de um indivíduo professar determinada convicção religiosa ou crença não o desabona para exercer qualquer atividade profissional. Afinal, juízes, como qualquer pessoa, possuem suas convicções e crenças particulares, as quais irão influenciar em certa medida o seu modo de vida, o que não significa necessariamente que o seu trabalho terá a qualidade reduzida ou que agirão com parcialidade e partidarismo.

Diante desse contexto, pode-se refletir sobre diferentes questões, dentre elas: Qual é o lugar das convicções e crenças particulares no exercício de funções públicas? Como deve ser a relação entre as convicções pessoais e o exercício de autoridade pública em uma sociedade democrática? 

REFERÊNCIAS:

https://www.npr.org/2020/09/29/917943045/amy-coney-barretts-catholicism-is-controversial-but-may-not-be-confirmation-issu

https://foreignpolicy.com/2020/10/28/barrett-court-catholicism-religion-judges-abortion/