terça-feira, 8 de junho de 2021

Pedido de prestação de serviço militar alternativo, ou sua dispensa, fundado em imperativo de consciência decorrente de crença religiosa, é negado pelo Tribunal Federal da 4ª Região.

 

Pedido de prestação de serviço militar alternativo, ou sua dispensa, fundado em imperativo de consciência decorrente de crença religiosa, é negado pelo Tribunal Federal da 4ª Região.


Autor: Victor Rayson Mendes dos Reis 

Resumo: Trata-se de demanda proposta por médico em razão de pedido de prestação de serviço alternativo ao serviço militar obrigatório, ou ainda, a dispensa da obrigação, fundado na alegação de que a crença religiosa do Autor/Apelante seria incompatível com os princípios e atividades decorrentes dos serviços militares. O requerimento foi negado em primeira instância, razão pela qual o médico apresentou recurso à decisão, sendo este também indeferido. O indeferimento do recurso foi baseado na Portaria 2681 COSEMI, de 28/07/92 (Regulamento da Lei de Prestação do Serviço Alternativo) onde está determinado que a objeção de consciência, decorrente de crença religiosa, deve ser manifestada no momento de alistamento ao serviço militar. Ainda, a Desembargadora considerou que não foi comprovado pelo Autor/Apelante tamanha impossibilidade na prestação dos serviços ao exército que fossem decorrentes de sua crença, já que ele tinha sido convocado para servir como médico e portanto, teria as mesmas atividades profissionais de qualquer outro médico que exercesse sua profissão mesmo fora do exército.

 

O caso que aqui se relata trata de Apelação Cível, sob nº 5014447-32.2019.4.04.7100/RS, proposta pelo médico Richard Demzanczuk Pereira, no intuito reformar/reverter decisão em primeira instância que negou seu requerimento de anulação do ato de convocação para o serviço militar obrigatório, na finalidade de que lhe fosse concedida autorização para prestação de serviço alternativo e, não sendo esta possível, que ele fosse dispensado da obrigação de prestação dos serviços militares. O pedido feito pelo médico foi baseado na objeção de consciência, tendo ele alegado a impossibilidade de se tornar membro do exército em razão dos princípios de sua crença religiosa não serem compatíveis com as atividades praticadas pelo batalhão.

Segundo a relatoria do caso, o Autor da demanda havia sido dispensado do serviço militar obrigatório em 2001, por excesso de contingente. Posteriormente, em 2013, quando graduou-se em Medicina pela Universidade Federal de Ciências da Saúde em Porto Alegre e, após a conclusão de sua residência médica, já no ano de 2018, requereu o adiamento da prestação dos serviços militares com base na Lei N° 5.292/97, para que finalizasse sua especialização em anestesia, curso que teve início em março e término em novembro/2018. Como o pedido administrativo foi indeferido, o médico ingressou com ação contra a União, que tramitou perante a 3º Vara Federal de Porto Alegre, onde obteve o adiamento do serviço militar até o fim do curso, isso é, em 24/11/2018.

Assim, aduz o médico que, ao final do curso de especialização, pretendia se apresentar para o próximo processo seletivo MFDV, com previsão de incorporação no batalhão em fevereiro de 2020. No entanto, antes mesmo que pudesse se apresentar para participar do referido processo seletivo, foi surpreendido com aviso telefônico de que deveria se apresentar pessoalmente e receber o ofício de designação à incorporação em 11/03/19, junto ao 29º Batalhão de Infantaria Blindado, mesmo sem ter participado do ato de seleção para àquela incorporação.

 Por não ter participado do processo seletivo, tendo sido simplesmente oficiado a ingressar ao batalhão, aduz o médico que teria perdido a oportunidade de requerer administrativamente a prestação de serviços alternativos em razão da objeção de consciência. A objeção foi pautada na alegação de que sua crença religiosa seria incompatível com a prestação dos serviços miliares, o que certamente teria evitado sua convocação ao ingresso no Batalhão.

Por esta razão, ingressou com demanda contra a União qual aqui se relata, desta vez requerendo não o adiamento da prestação dos serviços, mas sim a prestação de serviços alternativos ou a dispensa do cumprimento de suas obrigações para com o exército.

Em contrapartida às razões alegadas pelo Autor, a União argumentou que o fato do médico ter conseguido o adiamento da prestação dos serviços militares anteriormente, tal concessão não acarretaria na dispensa do cumprimento de sua obrigação como cidadão para com o exército, se baseando no próprio texto constitucional, especificadamente o art. 143 da CF.

Além disso, informou que o serviço prestado por profissionais da saúde é de fundamental importância para a corporação e em nada ofendem a consciência dos médicos que a prestam, haja vista que são os mesmos serviços que prestariam no exercício regular da sua profissão, mesmo que fora do exército.

A União alegou também que o médico tem tentado se eximir de suas responsabilidades militares por um longo período de tempo e, assim, percebendo que todas as suas escusas se esgotaram, recorreu à objeção de consciência. Diz ainda que o argumento repentino do Autor em relação a impossibilidade de prestação de serviços militares em razão de sua crença causa estranheza vez que, ao mesmo tempo que o médico diz professar tal fé desde sua infância, nunca havia mencionado tal situação nas solicitações de adiamento/dispensa feitas por ele anteriormente.

Diante das argumentações expostas tanto pelo médico, como pela União, o pedido do Autor foi negado em decisão primeira instância, razão pela qual ele ingressou com Recurso de Apelação, qual foi igualmente indeferido pela Desembargadora Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha.

A decisão da Desembargadora considerou que a opção pelo serviço alternativo ao serviço militar obrigatório, em razão da objeção de crença, deve ser manifestada na ocasião do alistamento militar, conforme Portaria 2681 COSEMI, de 28/07/92 (Regulamento da Lei de Prestação do Serviço Alternativo), o que não ocorreu, inobstante a afirmação do autor no sentido de que a sua crença religiosa vem desde a infância, ou seja, muito antes do alistamento.

Ainda, a julgadora ressaltou que o médico nunca havia manifestado o imperativo de consciência no momento em que fez o pedido de adiamento da prestação dos serviços para que realizasse a residência médica, tendo também deixado de se apresentar voluntariamente frente ao Batalhão após a conclusão da referida especialização.

Todas essas situações, ao ver da Desembargadora, deixaram claro que o Autor/Apelante buscava eximir-se de suas obrigações, na tentativa de que a objeção de consciência lhe servisse como um trunfo para não prestar o serviço militar obrigatório. Por fim, foi mencionado na decisão que médico não havia logrado êxito em demonstrar incompatibilidade intrínseca e insuperável entre os serviços que seriam prestados por ele, como médico na Corporação Militar, e a sua crença religiosa, razão pela qual não havia razões em proceder com a anulação de sua convocação para ingresso no Batalhão.

 

Fonte: https://trf-4.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/874278927/apelacao-civel-ac-50144473220194047100-rs-5014447-3220194047100/inteiro-teor-874278977