sábado, 5 de setembro de 2020

Goiás - Decreto Estadual n.9653/2020 e as alterações do Decreto n.9656/2020

 


Autor(a): Joyce de Fátima Garcia Silva, graduando(a) membro do Cedire

Orientadora: Andréa Letícia Carvalho Guimarães, mestre e advogada voluntária do Cedire

Goiás - Decreto Estadual n.9653  

Tema: Goiás - Decreto Estadual n.9653/2020 e as alterações do Decreto n.9656/2020

Conforme recente decisão do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada por videoconferência, no processo referente à ADI 6341, esclarece que as medidas tomadas pelo Governo Federal na MP 926/2020 para o enfrentamento do novo coronavírus, não afasta a competência concorrente dos Estados, Distrito Federal e Municípios para legislar sobre saúde pública.

Nesse sentido no dia 19 de Abril de 2020, foi publicado o Decreto n° 9653/2020 pelo Governo do Estado de Goiás, o qual dispõe sobre a situação de emergência na saúde pública do Estado em razão da disseminação do COVID-19. Esse trabalho de combate à pandemia conta com o apoio da Secretaria de Estado da Casa Civil e da Procuradoria Geral do Estado, que conta ainda com dados técnicos do Ministério da Saúde e da Secretaria Estadual de Saúde que possuem como objetivo conter o avanço do vírus.

O decreto em seu art. 2°, §1°, XXXIII, considera como essencial às atividades de organizações religiosas, desde que realizadas na forma do seu art. 15, o qual prevê diversas medidas de prevenção, como por exemplo, o uso obrigatório de máscaras e a recomendação de evitar aglomerações, e sugere, ainda, que sejam utilizados meios virtuais para a realização das reuniões.

No inciso VIII do art. 15, é estabelecido que as celebrações religiosas possam ser realizadas por no máximo duas vezes por semana sendo uma delas obrigatoriamente no domingo, com horários específicos e sem aglomerações. Entretanto, a obrigatoriedade de celebrações aos domingos viola  a auto-organização das religiões que possuem práticas nos outros dias da semana, impedindo o exercício da liberdade religiosa dessas comunidades, como por exemplo, as religiões de matriz africana possuem dias específicos da semana para os seus rituais, o que varia de terreiro para terreiro. Além disso, o dispositivo regulamentar, não menciona em seu texto qualquer referência à situação dos sabatistas.

Essas questões e omissões caracterizam uma inconformidade com o texto legal do art. 5, VIII da Constituição Federal, em que é assegurado que ninguém será privado de seus direitos por motivo de crença religiosa, bem como com o inciso VI do mesmo artigo, que garante a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, e o livre exercício dos cultos religiosos.

Alterações trazidas pelo Decreto 9.656/2020

Trouxe a alteração do inciso VIII artigo 15, em que foi incluído em sua redação que das duas vezes por semana que estão autorizadas as celebrações religiosas, uma seria obrigatoriamente no domingo e no caso dos sabatistas no sábado, mas ainda sim não menciona qual a melhor forma das outras religiosidades realizarem suas celebrações.

O Decreto 9.656/2020 também trouxe alteração ao parágrafo único do artigo 15, que dispõe que os cultos, celebrações e reuniões coletivas poderão ocorrer somente uma vez na semana, em certas cidades do Estado, na antiga redação obrigatoriamente no domingo, com a alteração foi acrescentado o dia de sábado, levando em consideração os sabatistas, e ainda, deixando de mencionar a situação dos outros credos.

Referências:

Constituição Federal

http://www.mpgo.mp.br/portal/conteudo/decretos-estaduais-coronavirus#.Xu4sLJpKjIU

http://portal.stf.jus.br/



Governo do Estado do Pará suspende temporariamente atividades não essenciais, mas garante o exercício da liberdade religiosa sem oferecer riscos


Autor(a): Luis Felipe Martins de Oliveira, graduando(a) membro do Cedire

Orientadora: Gabriellen da Silva Xavier do Carmo, mestranda voluntária do Cedire

Pará - Decreto Estadual n.729 

Tema: Governo do Estado do Pará suspende temporariamente atividades não essenciais, mas garante o exercício da liberdade religiosa sem oferecer riscos

O Governador do Estado do Pará, visando a contenção do avanço do vírus COVID – 19 e buscando evitar um eventual colapso no sistema de saúde público e privado, publicou o Decreto Estadual n° 729, de 5 de maio de 2020. Este decreto suspende temporariamente todas as atividades não essenciais nas cidades de Belém, Ananindeua, Marituba, Benevides, Castanhal, Santa Isabel do Pará, Santa Bárbara do Pará, Breves, Vigia, Santo Antônio do Tauá, Cametá, Canaã dos Carajás, Parauapebas, Santarém, Abaetetuba e Capanema.

Há discussão por parte de autoridades dos poderes executivo e legislativo e também de líderes de comunidades religiosas sobre a possibilidade de manter as suas atividades no contexto da pandemia, buscando, assim, garantir o exercício dos cultos religiosos e suas liturgias, assegurado no art. 5°, inciso VI, da Constituição, sem ignorar as orientações da OMS e dos especialistas que buscam proteger a vida e a saúde da população, que também são garantidas pela Constituição.

Ademais, a prática religiosa tem sido uma maneira de obter alívio, segurança emocional e saúde mental, para algumas pessoas, neste período de pandemia.

Dito isto, o referido decreto, no artigo 3°, parágrafo 1°, disciplina acerca dos cultos religiosos, uma forma encontrada pelo governo do Pará para garantir o direito de culto religioso e a preservação da saúde dos fiéis. O dispositivo diz que todas as atividades religiosas podem ser praticadas de modo remoto.

Ainda, o decreto admite a essencialidade das atividades religiosa voltadas a execução de atividades de cunho social e atendimento à população em estado de vulnerabilidade. 


Em meio à pandemia provocada pelo coronavírus, Governador do Estado do Mato Grosso libera a realização de atividades de cunho religioso



Autor(a): Beatriz Alves Gomes, graduando(a) membro do Cedire

Orientadora: Gabriellen da Silva Xavier do Carmo, mestranda voluntária do Cedire

Mato Grosso -  Decreto Estadual n. 407 

Tema: Em meio à pandemia provocada pelo coronavírus, Governador do Estado do Mato Grosso libera a realização de atividades de cunho religioso

O governador do Estado do Mato Grosso, Mauro Mendes, por meio do Decreto Estadual nº 462 de 22/04/2020, liberou a realização de atividades de cunho religioso desde que adotadas as precauções recomendadas pela OMS (Organização Mundial da Saúde) de prevenção e combate à infecção por coronavírus.

À vista disso, fica recomendado no art. 2º, § 1º do referido Decreto, a adoção das seguintes medidas: disponibilização de local e produtos para a higienização de mãos e calçados; distanciamento mínimo de 1,5m entre as pessoas; controle de acesso de pessoas do grupo de risco ao estabelecimento, inclusive pessoas com idade superior a 60 anos; suspensão de qualquer contato físico entre as pessoas; suspensão da entrada de pessoas sem máscara de proteção facial; e suspensão da entrada de pessoas quando ultrapassada em 50% a capacidade máxima do estabelecimento religioso.

Ademais, o mesmo Decreto aponta que enquanto a taxa de ocupação dos leitos públicos de UTI exclusivos para pacientes infectados pela COVID-19 for menor que 60% no âmbito estadual, não se recomenda aos municípios do Estado do Mato Grosso a adoção de qualquer medida restritiva além das contidas no artigo 2º do Decreto Estadual (art. 3º).

Nesse sentido, cabe o questionamento em relação ao limite dos poderes das unidades federativas brasileiras.

Primeiramente, é válido ressaltar que a Constituição Federal atribui competência concorrente à União e aos Estados para legislar em defesa da saúde (art. 24, inciso XII), uma vez que cabe à União a edição de normas gerais (art 24, § 1º) e, aos Estados, o exercício da competência suplementar (art. 24, § 2º), ou seja, complementar as normas gerais propostas pela União.

Além disso, a Constituição do Estado do Mato Grosso atribui ao Governador do Estado expedir decretos e regulamentos (art. 66, inciso III), decidir sobre a organização e funcionamento da Administração do Estado na forma de lei (art. 66, inciso V), além de decretar e executar a intervenção nos municípios (art. 66, inciso VI).

Soma-se a isso, também, o entendimento do Supremo Tribunal Federal, o qual assegurou aos Governos Estaduais, Distrital e Municipal, no exercício de suas atribuições e no âmbito de seus territórios, competência para a adoção ou manutenção de medidas restritivas durante a pandemia da COVID-19.

Portanto, enquanto a taxa de ocupação dos leitos de UTI destinados para a COVID-19 for inferior a 60%, como citado anteriormente, as atividades de cunho religioso poderão ocorrer normalmente desde que respeitadas as medidas de prevenção e combate à infecção por coronavírus.


Decreto municipal da prefeitura de Palmas, no Tocantins, institui órgão consultivo máximo formado por entidades cristãs.


Autor (a): Guilherme Mesquita Paschoal Filho, graduando(a) membro do Cedire

Orientadora: Andréa Letícia Carvalho Guimarães, mestre e advogada voluntária do Cedire

Caso: Palmas - Decreto Municipal n. 1.905

Tema: Decreto municipal da prefeitura de Palmas, no Tocantins, institui órgão consultivo máximo formado por entidades cristãs.

No uso das atribuições que lhe confere a lei orgânica do município de Palmas, Tocantins, a prefeita Cinthia Alves Caetano Ribeiro editou o decreto nº 1907, do dia 10 de junho de 2020, instituindo o Comitê Municipal de Igrejas Cristãs. O órgão máximo de caráter consultivo, vinculado ao Gabinete da Prefeita, prestaria consultas nas questões relacionadas às políticas públicas de educação, de saúde, de habitação, de regularização fundiária e sociais, inclusive ao orçamento. Gozava a comissão de caráter prioritário, junto aos órgãos e entidades municipais, para obter informações, dados e documentos necessários ao desenvolvimento das suas respectivas atividades. Tinha a competência de controle interno municipal, fiscalizando o cumprimento, pelos órgãos e entidades do Poder Executivo Municipal, das previsões contidas no ato. Entretanto, sua vigência foi curta, sendo revogado pelo decreto número 1910, do dia 11 de junho de 2020.

Entendimentos constitucionais possíveis.

O Decreto nº 1907/2020 estava diretamente relacionado com o artigo 19 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, inciso I, por estabelecer uma relação de aliança entre o Poder Executivo municipal e as religiões, provocando duas linhas de interpretação:

1) Uma contrária à constitucionalidade do decreto, visto que o artigo 19 da CF/1988 proíbe esse tipo de aliança firmada entre poder público e a religião, representando, assim, uma direita afronta à liberdade religiosa e à laicidade estatal, pois o ente federativo não deve instituir uma política para promover determinada religião, excluindo a participação das demais.

2) Outra constitucional, pois pode o poder público celebrar aliança com determinada religião quando há interesse público, gerando benefício para o corpo social. Portanto, não estaria o ente federativo incentivando a atividade religiosa, mas garantindo um benefício social.

Visto a revogação em prazo relativamente curto do decreto, a primeira linha de interpretação foi dominante, inicialmente, em relação a segunda. Em comunicado feito em uma rede social, a Prefeita Cinthia Alves Caetano Ribeiro afirmou que buscará um novo formato mais adequado para ampliar esse tipo de representação, visto que acredita ser necessário aumentar o debate sobre os efeitos da pandemia causada pelo Covid-19, sendo a religião um elemento extremamente necessário.

Comitê Estadual relacionado com o tema.

O governo do Estado do Tocantins, por meio da portaria Nº 259, de 03 de junho de 2015, instituiu o Comitê Estadual de Respeito à Diversidade Religiosa do Estado do Tocantins – CEDR/TO, com os objetivos de favorecer a promoção do direito à diversidade religiosa, de combater a intolerância e de proteger os cidadãos contra violações de direitos humanos por motivação religiosa.

O Comitê desenvolve junto à comunidade políticas de promoção do respeito à diversidade religiosa, ao caráter laico do Estado e do combate a intolerância. Capacita agentes públicos e privados sobre o tema, além de na esfera estadual de educação promover o ensino da diversidade e da história das religiões, inclusive as derivadas de matrizes africanas e não cristã. Visa, também, garantir a liberdade individual e coletiva de ser ateu, agnóstico e de não professar nenhuma religião.

Os membros que compõe o Comitê são oriundos de instituições, do poder público e de autarquias, como é o caso da Secretaria Estadual de Educação, Ordem dos Advogados do Brasil, Ministério Público Estadual, Instituições públicas de ensino superior, membros da sociedade civil e etc.

Fontes: 

Decreto nº 1907, do dia 10 de junho de 2020, Palmas- TO; 

Decreto nº 1910, do dia 11 de junho de 2020, 

Palmas- TO; PORTARIA SEDPS/TO Nº 259, DE 03 DE JUNHO DE 2015.


Os decretos e a segurança da liberdade religiosa no estado do Amazonas: possíveis ameaças e respaldos jurídicos


Autor(a): Magale Lemos Paim, graduando(a) membro do Cedire

Orientadora: Andréa Letícia Carvalho Guimarães, mestre e advogada voluntária do Cedire

Caso: Amazonas - Decreto Estadual n.42.099 

Tema: Os decretos e a segurança da liberdade religiosa no estado do Amazonas: possíveis ameaças e respaldos jurídicos


Art. 3º, do Decreto n°. 42.099, de 21 de março de 2020, do Amazonas, dispõe que: “Fica suspenso o funcionamento de todas as igrejas, templos religiosos, lojas maçônicas e estabelecimentos similares”. A suspensão de eventos públicos e privados ficou, por esse decreto, suspensa por um período de 15 dias a partir de sua publicação. O respaldo está na Lei n. 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, a qual dispõe sobre as medidas de enfrentamento a emergência de saúde pública para a proteção da coletividade (art. 1º, § 1º) diante da situação alastrante do Covid-19 no Brasil. Regulamentada pelo Ministro de Estado da Saúde por meio da Portaria n. 356, de 11 de março de 2020, fica sob responsabilidade desse dispor acerca de sua duração (art. 1º, § 2º).


Nesse sentido, a calamidade de saúde pública global, atrelada ao princípio da convivência das liberdades, ensejou medidas de restrição ao aspecto coletivo/público do exercício de direitos fundamentais, como no caso do direito a prática religiosa, diretamente afetada pela lei e pelo decreto supracitado, bem como pelas determinações da OMS. O artigo 18.º, número 3 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos permite que essas restrições à liberdade de manifestar a religião sejam feitas desde que essas limitações estejam de acordo com a Teoria dos ‘Limites dos Limites’ (Schranken- Schranken), isto é, previstas em lei e sendo limitadas de acordo com a própria Constituição. 


Assim, balizam a ação do legislador e garantem a proteção de um núcleo essencial do direito fundamental quanto à clareza de sua duração, determinação, generalidade e proporcionalidade das restrições impostas; além de proteção a segurança, a ordem, a saúde pública, a moral, as liberdades e aos direitos fundamentais de outrem, o que, por um lado, viabiliza as alternativas adotadas. Houve prorrogação para que as: reuniões religiosas presenciais permaneçam suspensas no Amazonas até 30/04/2020 (Dec. n. 42.216/2020), até “ulterior deliberação”; (art. 10, III, Dec. 42.247/2020). Ao analisar os dispositivos, percebe-se ausente uma segurança jurídica quanto ao requisito da temporalidade, considerado imprescindível para que haja suspensão de liberdades fundamentais. 


Todavia, a proibição pode dar margem a um embate principiológico, em que o decreto sancionado pelo governador do estado do Amazonas, Wilson Miranda Lima, estaria ferindo o direito fundamental à liberdade religiosa (art. 5º, VI, CF/88) e a laicidade estatal (art. 19, I, CF/88), o que o tornaria, portanto, inconstitucional. Além disso, no art. 19, caput, inciso I da Constituição Federal do Brasil, há a proibição de qualquer ente da federação de embaraçar o funcionamento de cultos religiosos ou igrejas, a não ser em caso de decretação estado de defesa, conforme art. 136, §1º, I, “a”, ou de decretação de estado de sítio, de acordo com o art. 139, IV. Nesse viés, decretos ou medidas restritivas neste momento, poderiam significar um ato de improbidade administrativa, bem como uma restrição indevida à liberdade religiosa por torná-la um direito fundamental impraticável. 


Posto isso, o Decreto n. 42.330, de 28/05/2020, em seu art. 7°, trouxe medidas complementares temporárias, e permitiu, a partir das 00h00 do dia 1º de junho de 2020, à exceção dos integrantes do grupo de risco, a retomada das atividades religiosas, limitados a 30% (trinta por cento) de ocupação, e ao período máximo de 1 (uma) hora e 30 (trinta) minutos, quando da realização diária dos cultos, respeitado um intervalo mínimo de 5 (cinco) horas entre um evento e outro, de modo a permitir a limpeza adequada no ambiente, evitando-se a aglomeração na entrada e saída de pessoas, e o período máximo de 4 (quatro horas), quando da realização semanal dos cultos. Tais ações complementares vieram de encontro com o anseio pela liberdade religiosa em sua amplitude, com uma tentativa de igualmente proporcionar proteção à saúde pública e garantir o direito à vida.